Cartomante
Depois de mais de uma semana com o cartão de visitas de Marlene, rolando de um lado para outro na minha bolsa, criei coragem para pegá-lo novamente. Chequei mais uma vez todas as informações contidas. Nome, número do celular e e-mail. Por alguns segundos pensei, que tipo de cartomante se chama Marlene Aparecida? Fiquei tentando imaginar se era dela mesmo, de batismo ou um pseudônimo. De qualquer forma, não achei um bom nome.
Mas o que valia mesmo eram as recomendações, e Marlene tinha de sobra, as melhores possíveis. O cartão de visitas dela, chegou até mim, pelas mãos de uma amiga do trabalho, que maravilhada me contou de todas as previsões acertadas por ela. Conforme Letícia listava, cada uma delas, falei que era uma pena ela não ter revelado os números da mega-sena do fim do ano. O qual ela prontamente respondeu que provavelmente foi porque ela não perguntou, afinal, não havia comprado o bilhete, e 250 reais investidos em meia hora de consulta, era necessário ser muito sucinta e perspicaz, fazendo as perguntas que realmente importavam naquele momento.
Essas, ela não quis me dizer quais eram, alegando serem muito pessoais. Porém, me disse algo que não esqueci e que é o que me faz não ter rasgado esse cartão na primeira oportunidade, e ele estar agora em minhas mãos.
– Sabe amiga, eu sei que você é cética e tudo mais, mas sei que na primeira oportunidade você também irá
– Ah, é mesmo? E por que você tem tanta certeza?
– Porque quase todo ceticismo evapora com uma boa dose de desespero. E eu sei que você está tão desesperada quanto eu.
Sorri sem graça. Minha piadinha infame sobre os números corretos da loteria, teve troco.
Me deixei levar por aquele pensamento e enfim, agendei. Sexta-feira, dia vinte de setembro, às 17 h.
No dia, fui ao encontro de Marlene, em um misto de dúvida e esperança.
Cheguei mais cedo do que imaginava, por isso, a princípio fiquei em uma pequena recepção, enquanto outra pessoa era atendida. Um cubículo de paredes brancas, mas suficiente para uma poltrona, um frigobar, uma mesa com uma cafeteira elétrica e alguns utensílios. Um filtro dos sonhos pendurado, um tapete cor lilás impecavelmente limpo, um quadro de ciganos ao redor da fogueira na parede atrás da poltrona.
Quinze para as 17 h, sai a pessoa que estava na sala, para minha surpresa, um homem de terno e gravata. Aquilo abriu um mundo de novas possibilidades em minha mente, quebrando estereótipos e mostrando que para estar desesperado a ponto de querer uma resposta para o futuro, não existe gênero, credo ou situação financeira. Basta estar vivo e ser humano.
Pois somente nós nesta terra, nos preocupamos de forma tão demasiada com aquilo que não existe.
Marlene que até então não havia saído da sala, veio em minha direção. Extremamente alta para os padrões femininos, corpulenta, de cabelos alvoroçados castanhos e hipnotizantes olhos azuis. Sentamos frente a frente, tendo uma mesa repleta de cartas nos separando. Tivemos uma breve conversa e logo após ela pediu que eu fizesse as perguntas que queria. A princípio eu estava desacreditada e estranhamente nervosa. Mas conforme falava sobre meus anseios, uma leveza pairava em mim e as respostas que recebia começavam a me dar uma certeza, mesmo que tímida, que todas as recomendações, eram de fato, verdadeiras.
Diferente da recepção, a sala de atendimento era repleta de cores e objetos, além de um cheiro forte e marcante, e tão diferente que a primeira coisa que perguntei era qual o nome do difusor utilizado, o qual ela guardou mistério. A cadeira era incrivelmente macia, as luzes geravam uma sensação de conforto para os olhos. Tudo parecia milimetricamente calculado para hipnotizar nossos sentidos e capturar nossa atenção. E realmente deu certo, em poucos minutos eu já esqueci que existia um mundo lá fora, parecia que ali eu iniciava uma jornada para um portal desconhecido e mágico. O que me fez voltar a sentir a materialidade da vida, foi quando ela me estendeu a maquinha do cartão, para que pontualmente após trinta minutos eu realizasse o pagamento.
Sai de lá acreditando que o destino estava a meu favor. Destino esse até então desconhecido e repleto de incertezas, com muito mais nãos do que sim. Mas Marlene Aparecida, havia me mostrado de forma tão convicta que tudo daria certo, que a nuvem de dúvida que pairava em minha mente, se dissipou em um instante. Voltei para minha rotina de sucessivos agora. Sem muitas surpresas ou reviravoltas, mas certa, que logo a frente, um mundo de grande possibilidades se abriria para mim.
Tiane Maga
Enviado por Tiane Maga em 27/01/2025